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sexta-feira, 27 de junho de 2014

Sofá Vazio


Ausência
Não é a falta
Não é o não ter
Não é o não ver
É saber o que fazer
Com o que sinto por você
Ausência
É ver que o sofá
Não tem mais sua marca
Que a TV não reverbera
Seu sorriso
Que a louça não sorri
Ao seu toque
Que a planta não se pinta
Mais com suas carícias
Ausência
É o quanto estou
Repleto de você
O quanto de você
Carrego em mim
E acabo sendo egoísta
Com esse sentimento
Pois não posso mais
Partilhá-lo consigo
Tento ausentar-me
Mas o vento que ecoa
Nas montanhas do passado
Uiva suave em meu ouvido
E nele só escuto sua cantiga
Só vejo a fumaça do café
E vejo sua mão enrugada
De pele fina e calo grosso
Acariciar o sofá
E me chamar pra sentar

Manogon

terça-feira, 17 de junho de 2014

VagArte

Se a vida se arrasta
Lenta
Se o vagar é um fardo
Aguenta
Se o deslizar é um arte
Inventa

Manogon

(Re)Verso


Que atire a primeira vidraça
Aquele que nunca foi pedra
Que aponte a cara no dedo
Quem faz do erro uma vida
Aquele que nunca se engasgou
Com o comprimento da língua
Que fique exposto na praça
Aquele que nunca queimou suas bruxas
Que seja beatificado em altar-mor
Quem só passou pelos pecados na vida
Que o corpo não fique desforme
Sob o peso diário da terra
Suportado mesmo antes da morte
Que a face sofrida não se trinque
Com o reflexo retorcido do espelho

Manogon

Oratório


Não escrevo poesia
Derramo sentimentos
Ora declamo o mundo
Ora descrevo paixões
Ora expurgo fantasmas

Não sou poeta escritor
Ora sou vento brando
Acariciando madeixas
Ora sou nuvem escura
Carregando tempestades
De sentimentos e pensamentos
Ora sou tormenta furacão
A causar tremores ao coração

Não canto flores em prosa
Não viajo com os pés no chão
Desconheço a cadência da rima
Nem palavras soltas em uma oração

Manogon

De Pernas pro Ar



Se Antônio subesse
O que é que é esse dia
Fazia tudo que desse
Pra mode casá Maria

Ah, se Antônio suber
O que se faz nessa noite
Dava uma surra em Jusé
Daquelas feias de açoite

Mas Antônio não se importa
Nem com Zé ou com Maria
Se pica pra fora da porta
Pra só voltá no outro dia

Ah, Antônio, volte, apareça
Abençoe o pãozinho do arroz
Ou vai ficá de ponta-cabeça
E só vai desvirá bem dispois

Acontece que Mariazinha
É doidinha pelo Zezito
Já rezou até pra Mainha
E também Santo Ixpedito

Só falta com Antônio falá
Pra mode fazer o casório
Pruquê se o Zé num casá
Já vai tá pronto pro velório

Então, por tudo de mais sagrado
Antônio, seja lá onde se enfiou
Venha na carreira, apressado
E traga o padre e o doutô

Assim, encerro essa prece
Pra que tudo termine em paz
E nem que seja na quermesse
Una essa mulhé e o rapaz

Manogon

Penitência


Trago em mim
Estacas no peito
Na esperança de findar
O sofrimento vampiresco
O mal súbito noturno
O sangue que vertia ao inverso
Saindo de minhas feridas
De meus olhos lacrimejantes
Sanguíneo farol flamejante
Queimando, ardendo, ferindo
Trago em meu peito
As estacas que enfiei
Inocentemente, sem querer
Na jugular da amada
Assim, como coisa pouca
Ao preço de um simples riso
Sem nada lhe oferecer em troca

Manogon